O Texto
O livro Seu Azul parte de um casamento afundado na monotonia. O engenheiro civil Luiz Fernando* e a consultora de marketing infantil Giuliana* buscam a terapia para reanimar a relação. Para que voltem a ter assunto, um analista recomenda que eles discutam na hora do jantar notícias dos principais portais brasileiros**.

As matérias selecionadas giram em torno de temas como o bumbum da apresentadora Regina Casé, dicas do super-herói Batman para ser bem-sucedido e os times de futebol dos atores do seriado Chaves. As conversas acabam por desembocar em temas diversos e de suma importância como aparências, vida em sociedade, morte e Steve Jobs. Os debates são testemunhados pelo filho de sete ano do casal, Allyson*. Ele retrata as discussões com desenhos, seguindo as orientações do analista. Mas não vamos nos aprofundar nisso porque temos uma parte inteiramente dedicada ao projeto gráfico do livro aqui.

Voltando a falar do texto (foco no assunto), as discussões do casal usam linguagem atual e coloquial.

Há sempre um bom humor, que em princípio faz rir, mas depois incita o leitor a pensar. “Seu Azul é um olhar sobre o mundo de hoje com o diagnóstico de falência múltipla dos órgãos”, define o autor, Gustavo Piqueira***.

Para contar essa história, o escritor optou por apresentar somente as falas, sem nenhum narrador descrevendo o contexto. Cabe ao leitor imaginar tom de voz gestos e outros elementos da cena. Alguns recursos gráficos ajudam nessa jornada. Luiz Fernando, por exemplo, fala sempre com a fonte em negrito. Ele de vez em quando abusa da bebida SUA MARCA**** (e suas falas saem com as letras espremidas), o que irrita Giuliana*. Mas aí já entramos no projeto gráfico. Leia essa parte após entender de maneira plena os asteriscos que pulularam este texto.

* Nomes fictícios ** Notícias verdadeiras
*** Nome verdadeiro
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O Autor
O paulista Gustavo Piqueira é daquelas pessoas difíceis de encaixar em apenas uma categoria. Formou-se na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP, mas atua como designer gráfico, ilustrador, criador de tipografias e escritor. Talentoso em todas essas áreas, vale destacar. (Bem, talvez não em arquitetura, já que a não ser por uma reforma mal-sucedida em um antigo apartamento, jamais voltou à profissão)

Em 1997 criou o estúdio Casa Rex, hoje com sedes em São Paulo e Londres, onde encara projetos diversos, tanto para multinacionais quanto os de menor porte. É um dos mais respeitados designers do Brasil, com mais de 200 prêmios no currículo.

Em 2004, Piqueira produziu seu primeiro livro. Desde então, foram 14 obras, que se dividem entre ficções, livros infanto-juvenis, obras sobre design, releituras de clássicos e ainda uma coleção de filosofia (confira o catálogo completo aqui). Em todos eles, há duas marcas claras: a ironia e os projetos gráficos que fogem do lugar comum.

Seus últimos trabalhos, aliás, têm atingido o patamar de livro-objeto, embora produzidos em larga escala. Tal é o caso da narrativa

visual Clichês Brasileiros (Ateliê Editorial), publicada em 2013, em que Piqueira usou uma coleção de matrizes tipográficas do início do século XX para contar a história do Brasil. O livro possui capa em lâmina de madeira impressa em serigrafia, fixada com fita adesiva, e tem tiragem única de mil exemplares numerados.

Um ano antes, apresentou a obra Iconografia Paulistana (WMF Martins Fontes), uma coleção de imagens reais e textos fictícios que formam um divertido retrato de São Paulo. O cosmopolitismo do qual muitos dos habitantes da cidade se orgulham é confrontado por horrorosos buffets infantis, arte urbana de conteúdo duvidoso, edifícios com nomes ridículos, restaurantes japoneses mequetrefes e uma avenida Paulista nada charmosa ou imponente. Um enorme espelho foi colado à capa do livro, que também teve tiragem única de mil exemplares numerados.

Para Piqueira, todos seus livros têm de combinar três pilares: narrativa, ilustrações e projeto gráfico. Confira as outras seções deste hotsite para entender como misturou esses elementos em Seu Azul.

Projeto gráfico

Seu Azul é um quebra-cabeças um tanto esquizofrênico de partes que funcionam de modo independente, mas formam um todo.

O livro é composto pelos diálogos dos dois personagens. E para explorar essa escolha narrativa de um jeito gráfico, Piqueira atribuiu diferentes fontes para as falas de Luiz Fernando* e Giuliana*. Também usou outros recursos tipográficos para dar tom aos diálogos, já que Seu Azul não tem narrador que descreva as reações dos personagens. Quando o casal começa a discutir, por exemplo, os textos ficam sobrepostos.

Cada capítulo é encerrado pelos desenhos do Allyson*, que contam com toda a ingenuidade de uma criança, mas são eles os que trazem o desconforto para o leitor. E como têm uma função narrativa muito forte, na hora de pensar no projeto gráfico Piqueira escolheu não colocá-los logo nas primeiras páginas. No lugar, incluiu uma série de fotos de casais felizes -- típicas de bancos de imagens -- como mensagens de venda de espaço publicitário.

Conforme a leitura avança, é fácil sentir um desconforto com o malestar do relacionamento decadente de Luiz Fernando* e Giuliana*. É justamente essa a sensação que o designer queria transmitir na capa. Depois de vários testes, o melhor resultado foi areia, grudada com cola de silicone. É uma experiência não apenas visual, mas tátil, que também abre possibilidades para outras interpretações.

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Os desenhos

Piqueira gosta que seus livros tenham ilustração. E no caso de Seu Azul, achou interessante que esses desenhos fossem de uma criança de sete anos, um dos personagens do livro.

Antes de assumir o papel de Alysson*, o designer entrou no universo das crianças para entender o tipo de construção que elas usam, os erros de proporção que geralmente cometem, a forma com que retratam os corpos, etc..

Depois de mergulhar nesse mundo, na hora de colocar o giz de cera na folha branca, as ilustrações saíram bem rápido. Piqueira começou a tarefa sem se preocupar muito com os capítulos. No final, viu em qual cada um se encaixava. “Gosto de criar coisas que conversem entre si, mas que tenham autonomia, assim como a música: cada instrumento faz a sua parte de um jeito livre, mas no final é uma obra só.”

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Equipe
Gustavo Piqueira | texto, ilustrações e projeto gráfico
Samia Jacintho/Casa Rex | produção gráfica
Cecilia Arbolave, João Varella e Thiago Blumenthal | edição
Trisco Comunicação | revisão
Luciana Martins | hotsite
Laíssa Barros | assessoria de imprensa e redes sociais
Bárbara Heckler e Pangeia de Dois | vídeos
Vídeos
Repercussão
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